“Vejam: a virgem conceberá, e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que quer dizer: Deus está conosco”.( Mt 1,23)
Sempre me tocou a austeridade do evangelista Mateus ao relatar o nascimento e a infância do Emanuel. Sequer uma palavra ou um gesto de Maria. Tampouco de José. Os dois sempre na sombra, discretos, partilhando ao lado do menino a rejeição, a indigência e a insegurança. Por que não vislumbrar nisto a primeira atitude que não pode faltar naqueles que pretendem revelar Deus à humanidade? Mesmo na pós-modernidade midiática. Nada de holofotes naquela noite de natal: só a estrela. Nada de protagonismo: só um menino chorando.
Mais interessante ainda, em Mateus, quando Jesus é chamado de “Emanuel”, que quer dizer “ Deu conosco”. Não mais o misterioso nome que assustava Moisés enquanto a sarça ardia. Bem mais compreensível ao entendimento e à experiência humana é a interpretação do velho Isaias: “O meu povo reconhecerá o meu nome; nesse dia compreenderá o que eu dizia:“Aqui estou! (Is 52,6)
Não pretendo pousar de biblista, ainda mais diante da simplicidade do natal de Belém. Tenho certeza, porém, que é exatamente aqui que o Deus de nossos pais faz a grande diferença. Desconcertante, simples e consolador um Deus cujo nome soa mais ou menos assim: “Aqui estou!” Sim: Deus sai de sua infinita distância e de sua invisibilidade e se torna visível, concreto e palpável. Um Deus que se deixa alcançar.
Entrando a fazer parte da nossa história com semblante humano, o Filho de Deus faz questão que continuemos a procurá-lo no meio dos homens e das mulheres. E, mais ainda, quer ser acolhido como homem. Por isso, desde que o Filho de Deus se tornou o Filho do Homem, só é possível encontrá-lo na convivência amorosa com seus filhos e filhas. Pois Ele, não só se fez homem, mas ficou para sempre entre nós.
Confesso que, até hoje, não consigo entender aqueles inúmeros pastores com seus respectivos rebanhos que pretendem “entender” de Deus mais que o próprio Deus. Nada contra os templos repletos de luzes, de sacrifícios e de louvores com atordoantes decibéis. Na certa, o Emanuel, o Deus conosco aponta em outras direções. Assim como a estrela, naquele primeiro dramático natal, apontava silenciosa para e estábulo e não para o palácio.
Em Belém, um menino nasceu tão distante e tão pobre que, ainda hoje, preferimos esquecer o seu nome. Na verdade, a quem interessa o Emanuel, o Deus conosco que, a todo instante, cruza o nosso caminho e não cansa de repetir: estou com fome e sede, sou estrangeiro, estou doente, não tenho roupa, estou mofando na prisão?
Neste Natal, esperando a Missa do galo, mais uma vez rezarei assim:
Quem diz que Deus, quem diz que ele é o Deus ,
o irmão,companheiro da gente pobre: deve saber o que diz.
Está dizendo que Deus é deserdado e pobre
explorado e amordaçado, como todo o povo pobre.
Quem diz: eu creio em Deus, eu creio em Deus,
e grita: Senhor, Senhor...mas quer prosperidade a todo custo
e arranca dinheiro da agonia dos pobres,
este renega aquele que disse: Eu sou um Deus de pobres.
Quem se sente quite neste sistema de “vale quem tem” e “a pobreza é normal” ;
quem pensa: “ninguém pode me obrigar; que culpa tenho eu? “
e chamando-se inocente lava as mãos:
este aí endureceu o coração e nega a Deus que diz:
- Sou eu mesmo que é sacrificado sem nome na farta mesa dos opulentos -.
Quem, nesta noite de natal
estende a mão, pega o pão e come,
está dizendo que quer um Mundo Novo onde haja pão e liberdade
para todos os homens e as mulheres.
Mas, quem tanto ousa, se dispõe a agüentar o que agüentou o Filho do Homem?
Tu Jesus, Emanuel, Deus conosco,
tu que te tornaste o último dos homens,
a tua palavra eu falo
o teu pão eu como
a tua morte eu morro?
Devo eu, como tu,
tornar-me companheiro desta multidão de gente pobre?
(Com essa oração, no ano da graça de 1979, desejava Feliz Natal aos meus paroquianos lá na Igreja de São João Batista em São Luis do Maranhão. Desconhecendo o autor, me permiti readaptá-la ao longo dos anos).

Que oração linda, Pe. Marcos. No ano da graça de 1979 nasceu uma graciosa menina que lhe quer muito bem.
ResponderExcluirUm beijo, feliz natal.
Vera