terça-feira, 29 de março de 2011

a deus marquinhos e thiago

Jovem foge e é morto dentro de escola

A vítima entrou na escola, no bairro José Walter, para fugir de dois bandidos que o perseguiam. Ele foi morto com quatro tiros de pistola. A suspeita da Polícia é de que o jovem tenha sido executado por traficantes.” (O Povo 29/03/2011)

Terça-feira 29 de março. Acabo de chegar do enterro do meu xará Marquinhos. No dia do batismo tive o privilégio de consagrá-lo, para sempre, com o meu mesmo nome. Tinha 19 anos e já fazia parte da corporação dos marinheiros do Brasil. Tocava violão e integrava os Mandacas, um entre os mais de 50 grupos musicais do Grande Bom Jardim.

  De moto, saiu de casa no último domingo à noite  para regressar ao quartel. Acabou tombando no asfalto da Avenida João Pessoa sem deixar rastros ou testemunhas. Jovem sonhador e realizado, como tantos outros jovens do Grande Bom Jardim, que vêm desmentindo os estúpidos preconceitos que estigmatizam  toda a juventude, só por morar neste ou naquele bairro de periferia. Munição suficiente, porém, que autoriza os senhores  da Ordem e da Lei a investir com todo o tipo de medidas repressivas.
Com as imagens do enterro ainda vivas nos olhos e no coração, abro o jornal.  Thiago, 19 anos também, é o jovem da manchete do periódico e de toda a mídia desta terca- feira.  Perseguido por quatro traficantes, tentou guarida escalando o muro da Escola Polivalente do bairro José Valter. Por sua vez, encontrando a porta aberta, um dos traficantes entrou no recinto da escola disparando quatro tiros. Thiago não sobreviveu. Podia ter acontecido em qualquer escola de ensino público ou privado de Fortaleza ou em qualquer outro lugar deste País onde a juventude morre antes do tempo.
Conforme a Polícia, Thiago respondia a processo por assalto e tinha envolvimento com drogas. Motivo suficiente para que as investigações, em casos semelhantes, fiquem por isso mesmo.


Conheço a história do Marquinhos e sei que, mesmo de família pobre e morando no Bom Jardim, teve a sorte de encontrar opotunidades e aproveitá-las  no tempo certo. Desconheço a história de Thiago. Nem sei se teve as mesmas, ou até mais oportunidades.  “Ele era usuário de drogas e tinha envolvimento com o crime”, afirmou o soldado do Ronda do Quarteirão que atendeu à ocorrência.
Pasmem! O artigo de “O Povo” afirma que, por conta da violência na área, a Escola Polivalente deixou de funcionar no turno da noite, este ano.  A coordenadora confirma: “Tem muito perigo aqui na comunidade. A evasão era grande. Muita gente tinha medo de vir estudar”. Tampouco não têm professores que se arrisquem a trabalhar no horário da noite. Um detalhe: somente dois vigilantes na escola. Um deles fica na porta principal, por onde os estudantes entram e saem. O outro fica circulando pelo colégio. A solução mais óbvia, então, é fechar o expediente noturno.O mesmo já aconteceu no bairro do Serviluz e em outras escolas de periferia, após fatos parecidos.

Diante do fechamento, nenhuma reação por parte dos pais. Coitados! Que condição e organização eles têm? Sem reação o MEC e as Secretarias, pouco importa se do Estado ou do Município. Os filhos não pertencem à  Pátria também? Sem reação o Ministério Público e as Igrejas, tanto faz católicas ou evangélicas. O mesmo diga-se das ONGs, das Associações de Moradores, dos Conselhos Tutelares e  do escambal.
Curioso: todo o dia farmácias são assaltadas deixando mortos e feridos. Até restaurantes  de luxo são alvo privilegiado de violentos arrastões. Sem falar dos assaltos a Bancos e das saidinhas bancárias, das barracas de praia e dos demais estabelecimentos comerciais.Já houve tiroteio também nos luxuosos shoppings. E as  vítimas na construção civil e a matança cotidiana da violência no trânsito. E ninguém  fecha farmácias, restaurantes, Bancos e barracas, nem tampouco construtoras, shoppings ou rodovias. Por que só as escolas públicas não podem ter o direito e a obrigação de ficarem de portas abertas a qualquer hora do dia e da noite e  nos feriados também? E tudo isso nas barbas dos traficantes ou de quaisquer bagunceiros.

E o Ronda? Muito cedo e inútil chamar a Polícia. Só depois de todos os Poderes Públicos e as Instituições esgotarem suas políticas educacionais e a comunidade com as famílias exaurirem suas propostas criativas.

Têm muitos Marquinhos aguardando uma oportunidade. O que aconteceu com Thiago não passa de um acidente de percurso.  Mas não será o último se alguém ou todos  não assumirmos nossas responsabilidades.

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