sexta-feira, 15 de junho de 2012

HUMANIDADE FERIDA

Opinião se houve e se respeita. E as divergências sempre sãosaudáveis. Estou aludindo ao meu modesto blog. Uns acham ineteressante por ser bastante eclético. Outros, pela mesma razão, vêem nisso o seu principal limite. Pelo sim pelo não, não deixa  de  retratar um pouco do  meu perfil. E dele eu gosto. Assim como gosto de revelar, nas entrelinhas das postagens, minhas crenças e descreças. Por falar nisso, hoje, festa litúrgica do CORAÇÃO DE JESUS, peço emprestado um trecho  significativo de uma meditação do monge Enzo Bianchi que pode ajudar a libertar a devoção ao Sagrado Coração de Jesus de tanta pieguice que nada tem a ver com o Evangelho.  


O toque de Deus que muda a vida

 




"...Os Evangelhos testemunham que Jesus encontrou um grande número de pessoas afligidas por várias doenças: deficiências físicas (coxos, cegos, surdo-mudos, paralíticos), doenças mentais (os “endemoninhados”, que designam pessoas afligidas de tempos em tempos por epilepsia, histeria, esquizofrenia, males cuja origem era atribuída a uma possessão diabólica), deficiências e enfermidades mais ou menos graves (leprosos, a mulher hemorroíssa, a sogra de Pedro atingida por grande febre).
O encontro com essa humanidade sofredora, com os rostos e os corpos desfigurados de muitos homens e mulheres, constituíram para Jesus uma espécie de Bíblia viva, em carne e osso, a partir da qual ele pôde ouvir a lição da fraqueza e do sofrimento humanos, pôde aprender a arte da compaixão e da misericórdia. Podemos dizer que esses encontros representaram para ele um magistério do humano e uma revelação do divino, um lugar de aprendizagem do viver e do crer: Jesus não aprendeu só com aquilo que ele mesmo sofreu (cf. Hb 5, 8), mas também com o sofrimento dos outros.
Os Evangelhos enfatizam o fato de que Jesus cuida dos doentes (o verbo grego therapeúein, "cuidar", ocorre 36 vezes, enquanto o verbo iâsthai, “curar”, 19 vezes), e cuidar significa, sobretudo, servir e honrar uma pessoa, ter solicitude por ela. Jesus vê no doente uma pessoa, faz vir à tona a unicidade dela e se relaciona com ela com a totalidade do seu ser, captando a sua busca de sentido, vendo-a como uma criatura disposta à abertura de fé-confiança, desejosa não só de cura, mas a cura não só, mas daquilo que pode dar plenitude à sua vida.
A propósito, gostaria de fazer um esclarecimento que considero decisivo. No coração dos episódios em que Jesus está lidando com pessoas doentes, não há técnicas de cura e atividade taumatúrgica ou exorcista, mas sim a atitude humana de escuta e de acolhida das pessoas, há a humaníssima realidade do encontro: não há, portanto, a doença, mas sim a pessoa humana.
Jesus não se encontrava com o doente enquanto doente: isso significaria pôr-se em uma condição em que o outro era encerrado em uma categoria, significaria reduzir o outro àquilo que era apenas um aspecto da sua pessoa.
Não, Jesus se encontrava com o outro enquanto ser humano como ele, membro da humanidade, igual em dignidade a qualquer outro ser humano. E, ao se encontrar e ouvir um ser humano, Jesus sabia acolhê-lo, isso sim, também como uma pessoa marcada por uma forma particular de doença.
Em suma, com a sua prática de humanidade, Jesus ensina que cuidar é, em primeiro lugar, encontrar e entrar em relação com um homem ou com uma mulher. Aproximando-se das pessoas não com o poder e o saber do médico, mas sim com a responsabilidade e a compaixão do ser humano, Jesus se apresenta na vulnerabilidade e na fraqueza, e assim consegue encontrar a humanidade ferida dos doentes entrando em uma relação autenticamente ética com eles"...

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