Boas-vindas ao Papa Chico
Frei Betto
Adital – 19.07.13
Querido
papa Francisco, o povo brasileiro o espera de braços e coração abertos. Graças
à sua eleição, o papado adquire agora um rosto mais alegre.
O senhor
incutiu em todos nós renovadas esperanças na Igreja Católica ao tomar atitudes
mais próximas ao Evangelho de Jesus que às rubricas monárquicas predominantes
no Vaticano: uma vez eleito, retornou pessoalmente ao hotel de três estrelas em
que se hospedara em Roma, para pagar a conta; no Vaticano, decidiu morar na
Casa Santa Marta, alojamento de hóspedes, e não na residência pontifícia, quase
um palácio principesco; almoça no refeitório dos funcionários e não admite
lugar marcado, variando de mesa e companhias a cada dia; mandou prender o padre
diretor do banco do Vaticano, envolvido em falcatrua de 20 milhões de euros.
Em
Lampedusa, onde aportam os imigrantes africanos que sobrevivem à travessia
marítima (na qual já morreram 20 mil pessoas) e buscam melhores condições de
vida na Europa, o senhor criticou a "globalização da indiferença” e
aqueles que, no anonimato, movem os índices econômicos e financeiros,
condenando multidões ao desemprego e à miséria.
Um Brasil
diferente o espera. Como se Deus, para abrilhantar ainda mais a Jornada Mundial
da Juventude, tivesse mobilizado os nossos jovens que, nas últimas semanas,
inundam nossas ruas, expressando sonhos e reivindicações. Sobretudo, a
esperança em um Brasil e um mundo melhores.
É fato
que nossas autoridades eclesiásticas e civis não tiveram o cuidado de deixá-lo
mais tempo com os jovens. Segundo a programação oficial, o senhor terá mais
encontros com aqueles que ora nos governam ou dirigem a Igreja no Brasil do que
com aqueles que são alvos e protagonistas dessa jornada.
Enquanto
nosso povo vive um momento de democracia direta nas ruas, os organizadores de
sua visita cuidam de aprisioná-lo em palácios e salões. Assim como seus
discursos sofrem, agora, modificações em Roma para estarem mais afinados com o
clamor da juventude brasileira, tomara que o senhor altere aqui o programa que
lhe prepararam e dedique mais tempo ao diálogo com os jovens.
Não faz
sentido, por exemplo, o senhor benzer, na prefeitura do Rio, as bandeiras dos
Jogos Olímpicos e Paraolímpicos. São eventos esportivos acima de toda
diversidade religiosa, cultural, étnica, nacional e política.
Por que o
chefe da Igreja Católica fazer esse gesto simbólico de abençoar bandeiras de
dois eventos que nada têm de religioso, embora contenham valores evangélicos
por zerar divergências entre nações e promover a paz? Talvez seja o único
momento em que atletas da Coreia do Norte e dos EUA se confraternizarão.
Como nos
sentiríamos se elas fossem abençoadas por um rabino ou uma autoridade religiosa
muçulmana?
Nos
pronunciamentos que fará no Brasil, o senhor deixará claro a que veio. Ao ser
eleito e proclamado, declarou à multidão reunida na Praça de São Pedro, em
Roma, que os cardeais foram buscar um pontífice "no fim do mundo”.
Tomara
que o seu pontificado represente também o início de um novo tempo para a Igreja
Católica, livre do moralismo, do clericalismo, da desconfiança frente à
pós-modernidade. Uma Igreja que ponha fim ao celibato obrigatório, à proibição
de uso de preservativos, à exclusão da mulher do acesso ao sacerdócio.
Igreja
que reincorpore os padres casados ao ministério sacerdotal, dialogue sem
arrogância com as diferentes tradições religiosas, abra-se aos avanços da
ciência, assuma o seu papel profético de, em nome de Jesus, denunciar as causas
da miséria, das desigualdades sociais, dos fluxos migratórios, da devastação da
natureza.
Os jovens
esperam da Igreja uma comunidade alegre, despojada, sem luxos e ostentações,
capaz de refletir a face do Jovem de Nazaré, e na qual o amor encontre sempre a
sua morada.
Bem-vindo
ao Brasil, papa Chico! Se os argentinos merecidamente se orgulham de ter um
patrício como sucessor de Pedro, saiba que aqui todos nos contentamos em saber
que Deus é brasileiro!
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