O Evangelho vem de Jesus Cristo. A religião não vem de Jesus Cristo
É preciso partir de uma distinção básica que agora vários teólogos já propuseram entre o Evangelho e a religião. O Evangelho vem de Jesus Cristo. A religião não vem de Jesus Cristo. O Evangelho não é religioso. Jesus não fundou nenhuma religião. Não fundou ritos, não ensinou doutrinas, não organizou um sistema de governo. Nada disso. Ele se dedicou a anunciar, a promover o Reino de Deus. Ou seja, uma mudança radical de toda a humanidade em todos os seus aspectos. Uma mudança, e uma mudança cujos autores serão os pobres. Dirige-se aos pobres pensando que somente eles são capazes de agir com essa sinceridade, com essa autenticidade para promover um mundo novo. Seria essa uma mensagem política? Não é política no sentido de que propõe um plano, uma maneira... não, para isso a inteligência humana é suficiente; mas como meta política, porque isto é uma orientação dada a toda a humanidade.
E a religião? Aah! Jesus não fundou uma religião, mas seus discípulos criaram uma religião a partir dEle. Por quê? Porque a religião é algo indispensável aos seres humanos. Não se pode viver sem religião. Se a religião atual aqui se desintegra... Há 38.000 religiões registradas nos Estados Unidos! Ou seja, não faltam religiões, elas aparecem constantemente. O ser humano não pode viver sem religião, mesmo que se afaste das grandes religiões tradicionais. Então, a religião é uma criação humana. Entre a religião cristã e as demais religiões, a estrutura é igual. É uma mitologia. Assim como há uma mitologia cristã, há uma mitologia hinduísta, xintoísta, confucionista. Isso é parte indispensável para a humanidade. Ou seja, como interpretar todo o incompreensível da humanidade pela intervenção de seres com entidades sobrenaturais, fora deste mundo, que estão dirigindo esta realidade.
Em segundo lugar, uma religião é feita de ritos. Ritos para afastar as ameaças e para acercar-se dos benefícios. Todas as religiões têm ritos. E todas têm pessoas separadas, preparadas, para administrar os ritos, para ensinar a mitologia. Isto é comum a todas. Então, isto devia acontecer com os cristãos também. Devia acontecer. Como poderiam viver sem religião?
Como começou essa religião? Deve ter começado quando Jesus se transformou em objeto de culto. O que aconteceu bastante cedo, sobretudo entre os discípulos que não o conheceram, que não haviam vivido com ele, que não haviam estado próximos dele. Então, a geração seguinte ou aqueles que viviam mais distantes, mais afastados, para eles Jesus se transformou em objeto de culto. Com isso se desumanizou progressivamente. O culto de Jesus vai substituindo o seguimento de Jesus. Jesus nunca havia pedido aos discípulos um ato de culto. Nunca havia pedido que lhe oferecessem um rito... nunca. Mas queria o seguimento, seu seguimento. Essa dualidade começa a aparecer cedo. 30 anos, 40 anos depois da morte de Jesus, já aparece com força suficiente para que Marcos escrevesse em seu Evangelho precisamente para protestar contra essas tendências de desumanização, ou seja, de fazer de Jesus um objeto de culto. Este Evangelho é precisamente para recordar uma palavra de profeta: Não! Jesus era isso. Jesus fez isso, viveu aqui neste mundo! Viveu aqui nesta terra.
Com o desenvolvimento da religião cristã que se fez – aqui problema para os teólogos –, progressivamente essa tentação reapareceu. Nasceu um começo de doutrina, o Símbolo dos Apóstolos. E o que diz o Símbolo dos Apóstolos sobre Jesus? Aah... diz que nasceu e morreu. Nada mais. Como se as outras coisas não tivessem importância, como se a revelação de Deus não fosse justamente a própria vida de Jesus, seus atos, seus projetos, todo o seu destino terrestre. Essa é a revelação, mas isso já vai se perdendo de vista. Os Símbolos de Niceia e Constantinopla, da mesma maneira: Cristo nasceu e morreu. O Concílio de Calcedônia define que Jesus tem uma natureza divina e uma natureza humana. Mas, o que é uma natureza? Um ser humano não é uma natureza. Um ser humano é uma vida, é um projeto, é um desafio, é uma luta, é uma convivência em meio a muitos outros. Isso é o fundamental se queremos fazer o seguimento de Jesus.
continua...
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