quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

 O POVO 18/02/2016

UTOPIA 
O Princípio Esperança
Carlo Tursi *

Longe de me render a esse doce canto de sereias, julgo ser necessário ressuscitar a razão utópica
O futuro da humanidade não parece animador. As perspectivas ecológicas e econômicas não são nada promissoras. Um sistema global de produção e de consumo, baseado em crescimento ilimitado e exploração predatória dos recursos naturais do planeta, está começando a dar sinais de esgotamento. Até o papa já tem advertido contra o aumento indiscriminado da população mundial (sic!), claro indício de uma nova consciência apocalíptica.
A razão utópica parece ter morrido, há tempos, de inanição. A nova geração – nossos filhos – carece de um projeto histórico de superação do que aí está. Certamente alimenta ainda sonhos de êxito profissional e amoroso, mas com relação ao coletivo dos humanos não é nada visionária. A trilha sonora de sua vida deixou de ser o convocatório “Vem, vamos embora (...); quem sabe, faz a hora!”, passando a ser o inerte “Deixe a vida me levar! Vida, leva eu!”. Convenientemente, apresenta-se uma filosofia “da hora” que, ao invés de lamentá-lo, exalta esse estado de coisas: para ela, o único tempo real seria o presente; o passado não existe mais, o futuro não ainda; portanto, vivamos o momento, sem nos preocupar com o amanhã, sem fazer planos para depois. Quem garante que vai ter um “depois”? Viva o aqui e agora, “carpe diem!”, como Luís XV que, advertido sobre a falência do Estado francês, teria dito: “Depois de mim, o dilúvio!”. Ou seja: dane-se!
“É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã. Porque se você parar pra pensar: na verdade, não há!” Desespero puro. Paulo de Tarso já conheceu essa postura filosófica vulgar e assim a caricaturou: “Comamos e bebamos, pois amanhã morreremos!” Leia-se: não alimente (falsas) esperanças nem grandes expectativas, pois te precipitarão fatalmente na frustração. Prefira a desilusão definitiva, apenas desfrute do presente do jeito que ele é, e alcançarás a serenidade. Qualquer perspectiva de transcendência histórica seria autoengano. Resta instalar-se no presente. Fim da história. Outro mundo não é possível.
Longe de me render a esse doce canto de sereias, julgo ser necessário ressuscitar a razão utópica. Precisamos urgentemente de um choque de fé em um futuro possível. Estou buscando inspiração em “O Princípio Esperança” (1959), de E. Bloch. “Doctaspes” é sua palavra de ordem: uma esperança bem informada e esclarecida, não cega, delirante ou escapista. Voltaremos ao assunto.

* Professor teólogo

Cá com o meus botões:
                                                      Publiquei o artigo acima sem pedir licença ao autor, meu amigo. 

Ao sábio pensamento do jornalista e escritor uruguaiano, falecido no ano passado, acrescento o meu também:
                                          "O desafio é encontrar a cada passo, uma razão para não desistir".


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